Alguma utilidade?

Apenas um pouco do que escrevo. Gotas da pretensão que assombra a juventude: a maldita idade lírica, da extrema eloquência com a grande arrogância. Resta apenas desorientação.

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quinta-feira, 2 de fevereiro de 2012

Sobre lembranças

Andar nos lugares tantas vezes já andados, mas que, por certos períodos, pareceram inexistentes. Enfurnados no porão do museu, há tempos longe de catálogo, sob panos mofados, ainda estão lá. Mesmo que não vistos, permanecem: ocupam espaços invisíveis e impalpáveis, conquanto pesados. E a volta daquele medo infantil que vinha com a sensação de estar muito longe de casa. Sim, aquele temor absurdo que brotava quando, depois de tanto tempo tão longe, duvidava se minha casa ainda estava lá. Ela ainda existiria, com sua alma repleta de aconchego? Alguém mexera no meu brinquedo preferido?
Essa era a parte que mais doía. As coisas e pessoas que nos definem ou nos definiram continuaram vivendo na nossa ausência. E é a distancia que se abre entre o interno e o externo, o alheio que vive em nós e sem nós, que macula toda a chance de imutabilidade das lembranças. É, até as lembranças mudam. Quem dera se fossem sempre conforto e aconchego como a casa distante que, mesmo depois de tanto tempo, continua igual.
Mas nunca são as mesmas. A sina das memórias é mudar e pedir que nos redefinamos para caber na nova cama, diferente daquela que deixamos antes da viagem. Encolher ou aumentar e resignar-se, por ver o melhor brinquedo quebrado. O melhor. No fundo, somos também os mesmos medos de criança. Somos tanto e tão intensamente o passado que falamos demais do futuro, cantamos em datas comemorativas e dizemos da memória como dádiva. Sempre presos no museu, vemos muitas vidas nas janelas, muitas histórias nas molduras e secamos em pó e traças, sem entender que o que será é tão somente o que já passou.